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A CULTURA DA VIOLÊNCIA SOCIAL


A CULTURA DA VIOLÊNCIA SOCIAL

 

                            MANOEL ESPERIDIÃO DO RÊGO BARROS NETO

 

“nada é mais fácil do que censurar um malfeitor; nada é mais difícil do que entende-lo” Dostoievski.

 

            A cultura da violência nasce da fragmentação e da fragilização subjetiva do sujeito excluído emocional e socialmente. É importante perguntar: o que é violência? “Violência é o exercício injusto ou descriminário” (Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua portuguesa 3.0).          E o que é agressividade?  “Agressividade é um comportamento adaptativo e intenso”. (MARCELOS. 2012. p. 1). Com base nesta ideia percebamos que o sujeito agressivo é vitima de violência constante, e apresenta dificuldade de se relacionar com ele e com os outros.

            É perceptível nas imagens ações da Privação liberdade ou na Liberdade Assistida, que os limites não foram construídos no âmbito familiar, sendo entregue a própria sorte. Vigotski (2010) observa que o fator decisivo do comportamento humano não é só biológico, e sim psicossocial. “A experiência do homem não é mero comportamento animal que assumiu posição vertical; é uma experiência social da humanidade e de seus grupos particulares” (VIGOTSKI. 2010. p. 44). As fórmulas do comportamento humano segundo o citado autor são: “(1) reações hereditárias + (2) reações hereditárias x experiência individual (reflexos condicionados) + (3) experiência histórica + (4) experiência social + (5) experiência desdobrada (consciência)” (VIGOTSKI. 2010. p. 44).

            Em nossa observação alguns comportamentos agressivos desenvolvidos nas Instituições de Ensino são reflexos (resposta) adaptativos devido a um comportamento descriminário e injusto. Podemos citar como exemplo aulas não dialogadas, impostas sem explicações ou sem atrativos que não despertam a curiosidade dos sujeitos, Regimento Interno não dialogado pelos coordenadores pedagógicos e ou forma de tratamento.

            Observasse também que junto ao não diálogo encontra-se: déficits cognitivos, transtornos de aprendizagens e comportamento antissocial. Contudo, é imprescindível percebermos que o dialogo em aulas atrativas deve fazer parte do planejamento, vivemos na época da informação, e a ludicidade deve ser presença nas aulas. Este planejamento deveria propor a construção do diálogo ou a troca do conhecimento, e não a imposição do objeto a ser conhecido. Vigotski (2010) observa que a experiência pessoal do educando se torna a base principal do trabalho pedagógico.

            Contudo, uma simples informação sem diálogo não é comparticipar saber. Um fato importante a ser discutido é que, um aluno do oitavo ano não sabe mais que o aluno do sétimo ano. “Educar significa, antes de qualquer coisa, estabelecer novas reações, elaborar novas formas de comportamento” (VIGOTSKI. 2010. p. 65). O citado autor (2010) acrescenta que do ponto de vista cientifico não se pode educar o outro. “É impossível exercer influencia imediata e provocar mudanças no organismo alheio, é possível apenas a própria pessoa educar-se, ou seja, modificar as suas reações inatas através da própria experiência” (VIGOTSKI. 2010. p.62). Diante dessa realidade, devemos ter em mente que somos apenas orientadores educacionais, não dono da verdade. Faz-se necessário perguntar: como trazer a curiosidade do saber se realizo apenas informação não dialogal, ou se imponho autoritarismo em minha prática de ensino?

            São nestas correntes de ideias que deveríamos construir uma social–democracia educacional, com direitos políticos, opiniões e comportamentos culturais e sociais diversos. Há de se considerar que um ambiente escolar democrático e saudável deve ser alcançado com motivações, respeito, autoestima, valorização pessoal e diálogos constantes. Do mesmo modo, a construção do Projeto Político Pedagógico e o Regimento Interno, devem ser comparticipados em toda Instituição.

            Contudo, cabe ressaltar que vivemos numa sociedade estética, capitalista e sectária, e o consumo desenfreado de bens e produtos levam os sujeitos de todas as classes sociais à cultura do narcisismo consumista.  Diante da perspectiva social capitalista ele passa a ser produzido pela cultura de massa. Vivemos numa sociedade marcada pelo estetismo delirante, pelo consumo desenfreado e pela informação ao nosso alcance. Este consumo e a falta de perspectiva social levam os sujeitos aos mais elevados delírios. Isto sem falar das Violências e das Violações dos Direitos Humanos, levando-os a ultrapassarem limites.

            Diante destas observações vamos denominar estes sujeitos de predadores do outro. “As violências, geralmente, caracterizam-se pela competição, pela pretensão de o sujeito perceber-se como melhor e de funcionar como um predador do corpo do outro para usufruto próprio” (Gangues, gênero e Juventude: donas de rocha e sujeitos cabulosos – Secretaria de Direitos Humanos – SDH. Brasília – DF. p. 40. 1ª edição – Ano: 2010). Podemos denominar de instinto primitivo imposto pela sobrevivência e pela competição social. Giacoia (2008) menciona que o fracasso social provoca um efeito perturbador podendo desencadear uma ação agressiva, ou um distúrbio funcionalmente análogo a uma neurose traumática. Essa neurose traumática é observada pela psicanálise como catexia, a catexia é uma sequência de pensamentos ou encadeamento de atos. Contudo, essa energia pulsional ocorre no estado primário, é importante termos em mente a compreensão sobre o que é pulsão. A pulsão é um estado de excitação corporal, essa é a fonte de todo processo catéxico.

            É preciso ressaltar que a cultura da violência é produzida pela sociedade estética e pelo consumo desenfreado, pela exigência do mercado a sujeitos especialistas, pela falta de apoio familiar, pelo uso de substâncias psicoativas e pelas condições de subsistência de algumas famílias. Este sistema coercitivo de ostentação do Capital passa a incentivar uma competitividade da beleza, da ostentação ou a idolatria ao dinheiro nas Classes sócias privilegiadas. Em nossa observação essa sociedade produz cada vez mais sujeitos delirantes, ansiosos e predadores do outro, isto é, predadores da competitividade do Capital, e até mesmo pela disputa por lugares privilegiados.

            Hoje somos expostos à competição, essa é objetivada também pela cultura da higienização de ruas nas Capitais brasileiras. Há de se considerar que vivemos um surto de saúde pública pela dependência do Crack.  A cultura de higienização espalha-se a partir das Instituições governamentais, fazendo crescer o preconceito das Classes dominantes. Como explicar jovens matando moradores de rua?

            Devemos pensar que existem duas sociedades, uma especialista e técnica e outra pobre, excluída e marginalizada vivendo em guetos separados pela apartheid da intolerância. Na verdade o estigma territorial é um fator histórico, estas sociedades foram expulsas das grandes Capitais pela Republica, depois pelo suposto Capitalismo Democrático. Hoje a higienização e a exclusão social levam os dependentes químicos do Crack a outros guetos, ou melhor, ao submundo da morte. Desta forma concluímos que o Capitalismo estético e Democrático criou uma espécie de apartheid e guetos. Essa cicatriz deixa uma ferida histórica e excludente no imaginário desta Classe social este preconceito histórico ao estigma do ato infracional.

BREVE HISTÓRICO SOBRE AS FAVELAS NO BRASIL

            Se buscarmos a história do Brasil, perceberemos Violência e Violação dos Direitos Humanos. As comunidades pobres ou guetos teve seu início no Século XIX, ou melhor, no fim da escravatura, início da Republica. As favelas cresceram com as demolições dos cortiços na Cidade do Rio de Janeiro e com o fim da guerra do Paraguai. O nome “favela” se deu porque na Região existia um arbusto ou arvore com sementes oleaginosas que se faz farinha rica em proteínas e sais minerais.

            Estes ambientes fechados pelo imaginário das Classes Burguesas impossibilitaram a entrada de políticas públicas ou qualquer outro sujeito a não serem os seus moradores. Contudo, é importante mencionar que esta impossibilidade, primeiro se deu pelo preconceito das classes dominantes, e seus moradores foram entregues a própria sorte. Como observamos estes guetos foram construídos pelo preconceito e demarcados pelo estigma territorial. 

            Contudo, foi a partir da Ditadura Militar que presos políticos foram encarcerados nos grandes presídios na Cidade do Rio de Janeiro, lá mantiveram contato com outros presos e ensinaram táticas de guerrilha e organização paramilitar, dava início às facções criminosas. Estas facções aproveitaram os becos para montar seus limites territoriais, como lhes foi ensinado à arquitetura, e locais de difícil acesso impossibilitava o acesso da Polícia.

            Estas comunidades viviam sem um conjunto de sistemas de serviços públicos como: esgotamento sanitário, abastecimento de água, energia elétrica, coleta de águas pluviais, telefonia, gás, coleta de lixo, escolas e postos de saúde e outros serviços. Diante dessa realidade, foram criados supostos serviços públicos pelos traficantes, estes serviços visavam o interesse comum. Porém, outros grupos ou facções criminosas chegaram a estes locais provocando medo e disputa territorial, foram criadas as milícias e grupos de extermínios. Estas milícias tomaram grande parte das favelas e passaram a cobrar caro pelos serviços como: transporte e segurança, telefonia, etc.

             “A carga simbólica que pesa sobre esses locais conhecidos e difamados, distorce e distende as relações sociais cotidianas” (Gangues, gênero e juventude: donas de rocha e sujeitos cabulosos – Secretaria de Direitos Humanos – SDH. Brasília – DF. p.45). Hoje, estes guetos foram dominados pelas Unidades de Polícia Pacificadoras – UPP’S no Complexo do Alemão na Cidade do Rio de Janeiro. Este domínio ajudou no reconhecimento de cidadania a estas populações, podemos citar o crescimento comercial e turístico, onde os investidores aproveita a curiosidade do mundo e mostra uma das áreas mais bonitas do Rio de Janeiro e perigosas da Capital. Contudo, todo crescimento comercial leva a outras formas de subsistências e Violação dos Direitos Humanos. Devemos ter em mente que para o reconhecimento de cidadania ainda falta investimento público como escola, atendimento social, saúde pública, respeito e dignidade.

            O estigma territorial ainda vem produzir preconceito social sobre os locais demarcados e seus moradores. Se observarmos, vamos perceber que nestas comunidades não existem cercas delimitando o território. As cercas são construídas pelo imaginário social ou pelo estigma territorial, isto é, cercamos comunidades com nosso preconceito histórico. Com efeito, os moradores são vítimas do Capitalismo estético e delirante, são monstros de outros planetas. Quando paramos nos sinais de trânsitos ou cruzamentos, ficamos assustados e tememos ser atacados pelos monstros que vivem nos sinais durante o dia e a noite se escondem.

 

                                                   REFERÊNCIAS

 

DICIONÁRIO PRÁTICO DE PEDAGOGIA. 1ª ed. São Paulo: Riideel, 2003.

 

LAKOMY, Ana Maria. Teorias cognitivas da aprendizagem. Curitiba: IBPCX, 2003.

 

MARCELOS, Viviane Avelino. A violência escolar. Disponível em: http:// meuartigo.brasilescola.com – Acesso em 04, ABRIL. 2012. As 21h01min.

VIGOTSKY, L. S. O desenvolvimento da percepção e da atenção. 7ª ed. – São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 21 a 31.

 

----------------, Psicologia pedagógica. 3ª Ed. – São Paulo : Editora WMF. Martins Fontes, 2010.

VIGOTSKY, Lev Semenovich. Implicações educacionais. 7º ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 87 a 125.

----------------, Teoria e dados experimentais. Domínio sobre a memória e o pensamento. 7º ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 31 a 50.

----------------, Teoria básica e dados experimentais. Internalização das funções psicológicas superiores. 7º ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 51 a 58.

----------------, Psicologia Pedagógica – 3ª ed. – São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2010.

DOSTOIÉVISKI, Fiódor. Primeiras impressões. São Paulo: Martins Claret, 2006. P. 33 a 49.

 

GIACOIA, Osvaldo. O sistema percepção/consciência e sua localização periférica no córtex cerebral. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. P. 50 a 62.

GANGUES, GÊNEROS E JUVENTUDE: donas da rocha e sujeitos cabulosos. Secretaria de Direitos Humanos – SDH. Brasilia – DF. 1ª edição – Ano: 2010.

 

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