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FATORES DE INTEGRAÇÃO E DESINTEGRAÇÃO DA VIDA FAMILIAR - ( WINNICOTT, 2005. pp. 59 a 72 - Capitulo VI)


WINNICOTT, Donald W. Fatores de integração e desintegração na vida familiar. 3ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

 

                                                           BARROS NETO, Manoel Esperidião do Rêgo

 

            O presente estudo analisa as bases familiares num contexto de integração e desintegração durante a vida familiar numa perspectiva cultural/vivencial. “O modelo pelo qual organizamos nossas famílias demonstra na prática o que é a nossa cultura, assim como uma imagem do rosto é suficiente para retratar o indivíduo[1]”. As sessões psicanalíticas com famílias europeias no pós-guerra levaram Winnicott a estudar a natureza humana, essa natureza é vista por ele como organismos vivos e complexos, cuja existência social/cultural leva os indivíduos a tendências naturais, e segundo ele, as frustrações acarretam sofrimento. 
            Quando trata sobre emigrações ou transferências de indivíduos para outro Estado e/ou País examina a ação e a necessidade inconsciente de liberdade, “[...]; depois viajamos periodicamente de volta para casa, para renovar o contato com a família[2]”. Em sua observação, matemos contato com os familiares de diversas formas, na realidade atual existem e-mails e redes sociais, isto é, ouvimos histórias e participamos de toda uma problemática sócio/familiar. Muitos encontros ou reuniões familiares são lembranças ou pontos umbilicais, não existe distanciamento, mas uma relação aberta e inconsciente, no qual, a criatividade humana pode escutar a natureza interior.
            Assim, segundo o citado autor é necessário observar que a relação vivencial/familiar necessita de estudos mais aprofundados, o conhecimento empírico é vazio, e ao mesmo tempo, não é suficiente para entender os estados emocional/transitórios. É importante um exame entre: a natureza humana e a cultura/social, isto é, as etapas e os limites dos sujeitos epistêmicos. Com base na sua afirmação, percebe-se que a família vem contribuir com fatores de desintegração social e familiar, pois, incorpora elementos e/ou tendências positivas e negativas, tanto dos pais quanto das crianças. Neste artigo, aprofunda sua análise com um olhar mais profundo sobre a desintegração oriunda dos pais. É necessário examinar que todas as tendências comportamentais são assimiladas pelos sujeitos durante a fase embrionária e a perinatalidade, isto é, são provenientes do self[3]. A aparente contradição entre a história social/cultural dos sujeitos e sua natureza individual leva a pensar sobre a atual vida contemporânea.
            Os estudos pedagógicos sobre violência e violação de direitos humanos na escola pública[4], demonstraram contribuições familiares nos comportamentos agressivos e déficits nas aprendizagens numa perspectivação de princípio de prazer[5]. Também foi observado que a metodologia apresentada pelos ensinantes é um dos fatores de desinteresse dos aprendentes em sala de aula. Por este motivo observa-se a necessidade de um estudo cientifico sobre o sujeito epistêmico, e familiar, pois, suas relações são estabelecidas entre a indagação/vivencial e o objeto de conhecimento. É importante destacar que todo desenvolvimento/emocional e/ou maturação[6] deve ser analisado como pré- condição de todo o aprendizado, pois, todo processo de aprendizado satisfatório só é completo se for ligado ao desenvolvimento emocional/familiar dos sujeitos. 
            Contudo, os dados colhidos e analisados durante as sessões pelo citado psicanalista informa a incerteza dos sujeitos com relação ao conjunto familiar. “Como psicanalista, estudando detalhadamente o desenvolvimento emocional, aprendi que cada indivíduo empreende à longa jornada que leva do estado de indistinção com a mãe ao estado de ser um indivíduo separado, relacionando à mãe, e ao pai e à mãe enquanto conjunto[7]”. Em sua observação a família tem seu próprio crescimento e a criança experimenta mudanças que surge como consequência gradual das atribulações familiares. Para ele a criança é protegida do mundo pela mãe e aos poucos vai sendo introduzida e/ou socializando-se com este mundo por intermédio da própria mãe.
            Quando trata sobre as tendências positivas diante do casamento examina a existência de casos em que os filhos não são bem vindos, estes interferem no relacionamento sócio/emocional do casal. Assim, diante de suas indagações a atmosfera familiar depende do relacionamento geral dos pais, ou seja, do contexto social/cultural e sexual. “Muitas famílias parecem não ser mais do que um grande problema, e, no entanto, não suportariam ser arrancadas do solo onde vivem e transplantadas para outro local[8]”. Partindo das observações do citado psicanalista, observa-se que diversos fatores envolvem os casais na formação familiar, não só as relações sócio/cultural, outros fatores, é o sexo. O sexo não é apenas uma questão de satisfação física/emocional, é um crescimento pessoal (maturidade), “[...]; quando tais satisfações advêm de relacionamentos agradáveis tanto para a pessoa quanto para a sociedade, elas representam um dos pontos culminantes da saúde mental[9]”.  Pois, menciona que os distúrbios sexuais estão associados com todos os tipos de neuroses, problemas psicossomáticos, potencialidades do indivíduo e a formação imatura familiar. E examina que os problemas de desencontros conjugais, são de ordens inconscientes e/ou desejos sexuais reprimidos.
            Para Winnicott (2005) muitas famílias boas e dignas não foram construídas sobre bases de satisfação física (sexual) por parte dos pais. Em sua análise o romantismo não é a melhor base para construção familiar, uma vez que existem questões imaginativas, como o de manter o relacionamento igual a dos próprios pais ou interesses culturais e financeiros. Há de se considerar que as muitas fantasias sexuais individuais ou dos casais são de ordens conscientes e/ou inconscientes. Estas as fantasias têm uma variedade infinita, é uma resposta inconsciente dos desejos reprimidos ao longo da vida, e tem uma importância vital para o relacionamento sócio/familiar. Nascem da natureza humana/social, e devem ser examinadas também pelas tendências egocêntricas e as alteridades[10] numa emergência significativa/vivencial e maturacional de cada um.
            Assim, o sentido da preocupação ou culpa inconsciente do casal diante das suas fantasias vêm acompanhados de alguns elementos destrutivos. E segundo Winnicott (2005) estes elementos deslocam-se na mesma intensidade de expressões físicas e amorosas. Diante de suas afirmações percebe-se que todas as crianças lidam com todas as fantasias referentes ao casal, sejam elas satisfatórias ou não. À medida que a criança é reconhecida pelos pais passa a apresentar uma sensação de alivio, livrando o casal do sentimento de culpa. Porém, um dos pontos observados pelo autor é que a fase gestacional pode trazer efeitos devastadores na relação conjugal, podendo aproximar ou afastar o casal. Estes estados emocionais levam algumas mulheres a um sentimento de negação, destruindo as fantasias. Do mesmo modo, o acolhimento na hora do parto, este é marcante...
            Convém examinar que não é possível entender as atitudes dos pais com relação aos filhos sem considerar a significação de cada filho diante de suas fantasias sexuais conscientes e inconscientes em torno da concepção. “Os pais têm sentimentos diferentes, e agem de modo diferente, em relação a cada um dos filhos. Muito disso depende do relacionamento dos pais na época da concepção, durante a gravidez, quando do nascimento e depois[11]”. Neste contexto os pais necessitam das crianças para desenvolverem o relacionamento conjugal, esta convivência gera impulsos positivos.  E considera a necessidade inconsciente de alguns pais sobre adoção. “As crianças requerem dos pais algo além do amor; requerem algo que continue vivo mesmo quando os filhos são odiados, ou fazem por sê-lo[12]”.
            Quando trata dos fatores de desintegração oriundos dos pais examina que estas dificuldades são desencadeadas pelo desenvolvimento emocional insuficiente ou por comportamentos antissociais. Mas, segundo suas análises a constituição familiar não se liga a maturidade parental, cada membro da sociedade adulta está em constante processo de crescimento psíquico/sexual ao longo da vida. Para os adultos (homens) é difícil crescer sem se desfazerem dos resultados positivos obtidos em desenvolvimento anteriores. 

            “No que se refere ao estabelecimento de uma família, a juventude é o melhor momento para o matrimonio. As crianças se desenvolvem melhor com pais não mais que vinte ou trinta anos mais velhos que elas, e ainda não muito sábios; tais pais aprendem com os filhos, e muito se poderia alegar em defesa disso[13]”.  

            Assim, boa parte dos fatores de complicação matrimonial advém de atitudes tomadas pelos pais, ao esgotar sua capacidade de sacrificar tudo em favor dos filhos. “Um ou ambos os pais começam a viver sua adolescência temporã. Isso talvez se refira especialmente ao pai, visto que a mãe não raro se descobre nas inesperadas ocorrências físicas e emocionais que acompanham o estado de maturidade[14]”.
            Diante desta perspectiva, observa-se que não devemos desprezar os que não eram suficientemente maduros à época do matrimônio durante a anamnese ou sessões. “[...], são obrigados a fazer a opção entre a tomada de novos rumos de crescimento ou a degeneração pessoal[15]”. E acrescenta sobre as tendências positivas da criança e observa: “[...], a integração da família deriva da tendência integrativa de cada criança individual. A integração não é um fato que se possa tomar como dado. A integração pessoal é uma questão de desenvolvimento emocional[16]”. Segundo ele a criança que se desenvolve bem, e cuja personalidade foi capaz de realizar internamente seu crescimento individual, exerce um efeito integrativo sobre o ambiente.  

 “Quando a criança não contribui, os pais têm de tomar sobre si uma tarefa nada natural – devem construir e manter um lar e uma atmosfera familiar apesar de não poderem contar com a ajuda daquela criança. No cumprimento dessa tarefa, há um limite além do qual não se pode esperar o bom êxito dos pais[17]”.  

            A sociedade depende da integração e da unidade familiar, isto é, a sociedade sadia depende de uma proporção de indivíduos com integração satisfatória. Para o citado autor, os indivíduos sadios devem existir em números suficientes suprindo as necessidades das personalidades não integradas, ou a sociedade degenera chegando ao caos.
            Quando trata sobre os fatores de desintegração advindos das crianças, trata sobre desenvolvimento insuficiente como distúrbios psiquiátricos infantis e antissociais (sujeitos doentes). Como exemplo da tendência antissocial, a família passa a ser o alvo dos anseios destrutivos, sendo objeto de fúria da criança ou do adolescente. Contudo, nestes casos devem ser examinados que as ações comportamentais são inconscientes, a criança procura alguma coisa boa que foi perdida em datas passadas. A estes comportamentos devem ser incorporados: o momento vivenciado pelo casal, à fase gestacional e o princípio de prazer antes da gestação.
            Estes padrões destrutivos desenvolvidos por crianças e adolescentes devem ser examinados como desintegração da vida familiar. Provém do desenvolvimento insuficiente ou do desenvolvimento emocional entre a mãe e a criança. “[...]: há algo no desenvolvimento sadio de cada criança que constitui a base da integração do grupo familiar[18]”. Cabe ressaltar que a criança sozinha não é capaz de produzir uma família, sem os pais ou o princípio do prazer formado pela relação conjugal, não existe família. “A força desse grupo advém do fato de ser um ponto de encontro de forças que derivam dos fatores inatos ligados ao crescimento de cada criança – fatores estes que agrupei sob a denominação geral de tendência para integração[19]”. É importante destacar que as tendências antissociais derivam dos primeiros estágios de desenvolvimento infantil quanto ao self. Isto é, o sujeito psíquico emerge de uma relação funcional com o outro, e/ou da qualidade do acolhimento erótico com este outro, depende da cumplicidade materna, da maturidade adulta em relação à fantasia desejante. Essa maturidade permite uma expressão espontânea das tendências e/ou o livre exercício desta fantasia, tornando possível a posição de cada sujeito na vida familiar, permitindo autonomia e maturidade.


[1] WINNICOTT. p. 59
[2] Ibid.
[3] Sentimento difuso da unidade da personalidade individual – atitudes e comportamentos. Dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa – 3.0.
[4] BARROS NETO, Manoel Esperidião do Rêgo. Violência e violação de direitos na escola pública: desafios enfrentados por docentes e gestores. Natal RN: ed. do autor, 2012.
[5] GIACOIA, Osvaldo. Além do princípio do prazer: um dualismo incontornável. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. p. 25.
[6] Processo de crescimento, evolução, maturidade. . Dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa – 3.0.
[7] Ibid. p. 59.
[8] Ibid. p. 61.
[9] Ibid.
[10] Situação, estado ou qualidade que se constrói através das relações de contraste. Dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa – 3.0.
[11] WINNICOTT, p. 63.
[12] Ibid. p. 64.
[13] Ibid. p. 65.
[14] Ibid. p. 66.
[15] Ibid. 67.
[16] Ibid. p. 69.
[17] WINNICOTT. 2005. p. 68.
[18] Ibid. 72.
[19] Ibidem.

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